Conto rápido
Já era tarde da noite quando soou a campainha da porta de Fernando.
Ele, que já quase adormecera, pulou da cama e cambaleante vestiu o roupão atoalhado azul marinho, dado por Teresa no Natal passado, quando ainda estavam juntos. Sacudindo a cabeça para afastar o sono e as lembranças do amor, dirigiu-se até a porta, espiou pelo olho mágico, não havia ninguém.
Revoltado, praguejando contra o mundo voltou para cama, sentou-se, olhou o despertador que marcava duas da madrugada, lembrou que teria de acordar às 5:30 h. Não conseguira dormir ainda e a imagem de Teresa voltou-lhe à mente mas derrubado pelo cansaço adormeceu.
Soa o despertador, Fernando arrisca um só olho e vê que já é hora de acordar, embora a fadiga pela noite mal dormida lhe dissesse que ficasse eternamente na cama.
Após espreguiçar-se demoradamente, levanta, vai ao banheiro, barbeia-se, toma uma ducha para espantar a preguiça, arruma-se e vai para a cozinha preparar o café. Já sentado à mesa, mal começa a beber seu leite, ouve a campainha de serviço. Levanta, dirige-se à porta, espia pelo postigo e, como na noite anterior, não vê ninguém. Por via das dúvidas abre a porta e ao olhar para baixo depara-se com uma cesta de palha, daquelas usadas pelos padeiros ambulantes, e, dentro dela, enrolado em uma manta, havia um volume que se mexia. Tomado pela curiosidade desenrolou a manta e descobriu, entre estupefato e apavorado, tratar-se de um filhote de canguru.
Fernando sentiu que estava perdido, um canguruzinho ninguém merece, parece praga de sogra. Logo ele que nem sogra tem!
O pequeno marsupial olhava-o com cara de órfão esfaimado e Fernando, alucinado por animais, mesmo apavorado ante o inusitado, acolheu o bichinho disposto a saciar-lhe a fome.
Esquentou um copo de leite e deu-o às colheradas na boca. Após amamentá-lo enrolou o animal com a manta colocando-o a seguir de volta na cesta e saiu para o trabalho já atrasado.
Enquanto dirigia em meio ao trânsito caótico, indagava-se quem lhe fizera tamanha maldade e como resolveria tão grande problema. Uma coisa era certa, teria que se livrar do animal. Imagine um canguru adulto dentro do apartamento!
Não poderia justificar seu atraso com o fato ocorrido, ninguém acreditaria!
Durante o trabalho preocupou-se com o canguru. Como estaria ele, com fome? Pulando e quebrando tudo no apartamento? À medida que pensava imaginava cenas desastrosas como a da vizinha do 702 sendo atacada pelo saltitante bicho adulto. O suor molhava-lhe a testa como que delirasse de febre.
De repente soa estridente a sirene de uma viatura e Fernando acorda assustado mas, ao mesmo tempo aliviado pois tudo não passara de um terrível pesadelo amenizado apenas pela doce lembrança de Tereza, seu eterno amor com quem brigara há três cruéis longos meses.
Betofreire
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